segunda-feira, 6 de maio de 2013

Amo-te, querida mãe

O dia assinalado para celebrar as mães foi ontem – o Dia da Mãe!

Faria sentido que ontem tivesse escrito qualquer coisa para marcar o dia e essencialmente para homenagear a grande mãe que tenho! Mas, a verdade é que o dia foi agitado, com vários compromissos, entre eles, mimando a minha mãe e a mãe do meu marido (a minha sogra), por quem também tenho um carinho especial, e recebendo mimos dos meus filhos.

Também sou mãe… mãe de dois filhos lindos que me ensinam cada dia a ser melhor, a ser mais tolerante, a ser mais bondosa, a ser mais paciente… embora, algumas vezes, em dias de birras e maus comportamentos (também têm) eu fique suspensa e esqueça que ser mãe também é encarar com amor estes momentos difíceis e nem sempre a paciência é minha amiga.

Acho que nunca vou conseguir colocar em palavras a admiração e o amor que tenho pela minha mãe. Desde cedo que lhe reconheço um caráter especial, uma força quase sobre-humana de vencer e um amor de mãe titânico que tem por os filhos e pelos netos, sempre sem pedir o mesmo amor em troca.

Para compreender esta maneira de ser especial que eu gostava de um dia conseguir dizer, é preciso perceber que é uma mulher nascida nos anos 40, num Alentejo profundo, a segunda filha de 8 filhos que não pôde ir à escola, porque tinha outras responsabilidades demasiado pesadas para uma criança (mas, na época era assim!): ajudar a cuidar dos irmãos e das lides da casa.

Era uma linda rapariga (e ainda hoje é uma linda mulher), muito cortejada pelos jovens da aldeia. Olhos azuis como o mar que só conheceu muito tarde, cabelos loiros como o sol que lhe torriscava a pele, enquanto cumpria as lides do campo e as lides domésticas que se faziam ao ar livre, como lavar a roupa no ribeiro e carregar a água do poço. Corpo elegante, tão elegante como eu gostava de ser, mas a mim os genes das pernas gordas do lado paterno sobrepuseram-se aos genes magrinhos dela.

Ainda que com apenas metro e meio de altura (este gene já me calhou a mim), os rapazes não ignoravam a sua presença nos bailes e nunca se sentiu baixinha. E com razão, porque é, sem dúvida alguma, uma grande mulher.

Contra simpatias da família, casou por amor com o único homem que lhe fez palpitar o coração e rumou a sul, enquanto a restante família foi construindo vida na zona da capital.

Viveu, e vive, com humildade, para a família, aceitando a ajuda dos vizinhos que ainda hoje recorda com carinho, e para as responsabilidades da casa. Trabalhava no campo, de sol, a sol e não ambicionava muito mais, desde que a família estivesse unida.

Do seu ventre saíram 2 filhos e 2 filhas, uma das filhas (eu) já chegou tardiamente, quando ela tinha 38 anos, e chorou porque, na época, já não era idade para ter filhos. Acho que, no fundo, a sociedade da altura achava que nessa idade os casais já não teriam uma vida sexual e ter filhos era dizer aos vizinhos que afinal ainda viviam uma intimidade.

Ela conta-me sobre esta vergonha de me ter tido na barriga, mas isso nunca me entristeceu! Sei que sempre me amou e que a revolta era para os que lhe apontavam o dedo e não por mim. Sorriu, ao recordar isto e a pensar que hoje em dia, muitas mulheres são mães pela primeira vez com esta idade!

Enlouqueceu, literalmente, com o coração destroçado e a cabeça em mil e uma preocupações, quando o marido saiu para comprar cigarros e nunca mais voltou. Quer dizer, ainda voltou algumas vezes com o perdão dela, mas nunca definitivamente, até ao dia em que ela lhe fechou de vez a porta do coração.

Com uma filha de 4 anos, por ciar, como se dizia na época, com um filho numa cama de hospital em coma sem saber se o iria voltar a ver acordado, outro filho que lhe dava preocupações e uma filha casada que precisava da ajuda dela… esta poderia ter sido o início de uma história de drama infindável, mas não foi!

Bateu no fundo da tristeza, mas a mola da esperança, impulsionou-a com uma garra imensa para ultrapassar sozinha problemas e dificuldades que nos fizeram a todos crescer e acreditar que podemos lutar por dias melhores, ainda que o presente possa parecer sombrio.

É engraçado como ao escrever estas palavras, e recordo estes momentos muito bem, sinto que fui uma criança feliz e sou uma mulher feliz. Acho que porque, apesar de momentos muito difíceis, vividos com grandes dificuldades financeiras, nunca nos faltou o amor de mãe, um amor que coloca acima de tudo e de todos, os filhos e os netos que foram acrescendo à família, nem nunca me lembro de sentir que não ter determinadas coisas, que eram próprias para crianças e adolescentes na época, me entristecessem ou me frustrassem.

Não quis resignar-se às dificuldades e foi lutando por uma vida melhor, para ela e para os seus. Sem estudos, sem saber juntar as letras ou entender especialmente os números, aprendeu a escrever o nome completo, porque não queria que no B.I. aparecesse em vez da assinatura  as palavras "não sabe escrever" e aprendeu muito bem a fazer as contas que compunham a sua vida. Nunca se deixou enganar e ainda hoje não há ninguém que resolva um problema da vida melhor do que ela.

Na cidade encontrou uma vida melhor, trabalhando na casa de muitas famílias a quem deixou que lhe ensinassem muitas coisas e a quem dedicou amor, como se fossem parte dos seus.

Hoje, com 73 anos, não se deixa abater pelas dores que querem entrar nos ossos e continua a lutar, a lutar essencialmente pelo bem-estar da família. Como somos muitos, há sempre coisas a acontecer, e às vezes são más… doenças, arrufos, rebeldias, etc, mas ela está sempre na linha da frente de tocha de esperança içada a dizer sigam-me, vamos resolver o problema.

Questiono-me todos os dias, onde é que aquele corpo franzino vai buscar tanta força e como é que aquele coração ainda consegue encher mais um bocadinho!

Embora seja simpática, não é daquelas pessoas de simpatiazinha fácil. É determinada, muito refilona e muito frontal no olhar e às vezes nas palavras. Não gosta de injustiças, por isso luta como uma leoa pela equidade. Nunca teve medo do trabalho e trabalha com uma força tal que com esta idade ainda pinta a casa sozinha, empurra móveis, põe-se em cima das mesas e só nos conta quando já está feito, sempre com a desculpa de que nós temos a nossa vida e que não quer atrapalhar, pedindo ajuda. Nem fica com remorsos que isso nos deixe (aos filhos) fulos!

Recentemente apoiou os filhos, na partida do marido (marido, porque nunca se divorciou, nem nunca teve outro amor)! Abraçou-os e chorou com eles ao lado do caixão daquele que escolheu um dia partir, mas que tarde voltou para perto desta família. Soube dar-lhe o perdão, ainda que não tenha voltado a abrir-lhe a porta do seu coração. E quando foi preciso, abnegou -se de qualquer orgulho que se pudesse imaginar e ajudou a cuidar dele num momento de vida difícil. Deixou que os filhos dele, da outra mulher, lhe chamem tia e sorri.

A vida deu-lhe 5 netas, 2 netos e uma bisneta, e luta por eles, com o mesmo afinco que tem pelos filhos, com o bónus de um carinho ainda mais especial.

Gosta dos nossos mimos, e acho que nunca lhe vamos conseguir dar todo o amor que ela merece. Gosta de nos ver juntos e a rir! Ama os abraços dos netos, tanto dos pequenos como dos grandes! Sorri quando ouve chamarem-lhe bisavó! Não gosta de dormir, nem de preguiça, numa atitude de quem quer aproveitar todos os segundos da vida. Gosta do meu marido e mima-o como se filho fosse, com um grande respeito. Gosta de coisas doces e não se deixa vencer pelas amarguras da vida!

Raramente, lhe ouvimos dizer “no meu tempo”, porque na realidade ela nunca se deixou envelhecer no passado e vive cada dia com a certeza de que este também é o seu tempo.

Fala da partida dela de um dia, com uma naturalidade que me irrita, porque gosto de senti-la como imortal.

É uma mulher boa, sem dúvida, mas não é aquela bondadezinha… é amor, uma amor maternal que vive em todos os momentos!

Não sabe ler, não sabe escrever, não sabe bem contar, mas sabe AMAR!

1 comentário:

  1. Olá Ana....o que tu fizeste foi simplesmente....LINDO!!
    Fizeste-me chorar que nem Maria Madalena, não por tristeza mas, por ter muito orgulho de ter sido criada por esta mulher que é minha avó, mas sempre foi uma mãe para mim e, que , se hoje sou o que sou, a ela muito devo. Devia ser um exemplo para muita gente, principalmente no que respeita à força que tem que parece ser infindável e no amor incondicional que tem por todos os seus e, que muitas vezes não é reconhecido o merecimento de total respeito e admiração. Também tu és e sempre foste especial para mim, pois se fui criada pela minha querida avó, tu também andaste sempre por perto, tal irmã mais velha....Muito Obrigada por esta partilha(não sou capaz de dizer mais nada, apenas que vos amo muito e agradeço muito por tudo)! Espero que esta lembrança me seja eterna! Beijinhos grandes

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